Marco Archer
Caryl Chessman
“Chessman não deve morrer”. Era o título da campanha promovida pela Rádio Dragão do Mar em 1960, há quase 55 anos, em favor da vida de um condenado à morte: o norte-americano Caryl Chessman. A justiça dos Estados Unidos o havia considerado culpado de crimes gravíssimos: assaltos à mão armada e estupros.
Lutou até o fim por sua vida. Na prisão, escreveu livros que se tornaram
best-sellers, nos EUA e em vários países, nos quais narrava episódios da infância,
juventude e maturidade: 2455: Cela da
Morte, A Face Cruel da Justiça, A Lei Quer Que Eu Morra, O Garoto Era um Assassino (romance).
O então papa João XXIII, outros líderes políticos e religiosos mundiais, escritores,
escritoras, atores e atrizes de Hollywood pediram pela vida de Caryl Chessman.
A Rádio
Dragão do Mar, de Fortaleza, fez uma campanha emocionante. Outras emissoras de rádio
brasileiras e internacionais se engajaram na causa. De nada adiantou.
Detalhe:
toda essa mobilização para salvar a vida de alguém condenado por estupro,
considerado o crime mais desprezível na escala da marginalidade. Os estupradores
são rejeitados até por detentos autores de outros delitos.
O então
presidente norte-americano Dwight Eisenhower, um dos comandantes aliados da
Segunda Guerra Mundial, recebeu apelos de todas as partes do mundo, mas não os
atendeu. Também não acusou os apelantes de interferência na justiça dos EUA. Os
pedidos foram feitos e Einsenhower os negou. Tão simples.
Chessman foi asfixiado na câmara
de gás no dia 2 de maio de 1960, no Presídio de San Quentin, Estado da Califórnia
(EUA).
Até hoje há
quem acredite na inocência de Chessman. Tudo indica, porém, que ele era
culpado.
Quase 55
anos depois, em janeiro deste 2015, a história se repete, com o fuzilamento do
brasileiro Márcio Archer Cardoso Moreira, carioca de 53 anos, no último sábado
(17/1, às 15h31, no horário de Brasília) ou domingo (18/1) pelo horário da
Indonésia. Archer, instrutor de voo
livre, estava preso no país asiático desde 2004, quando foi flagrado no
Aeroporto Internacional de Jakarta com 13,4 kg de cocaína escondidos nos tubos
de uma asa delta. Conseguiu fugir, mas foi recapturado 15 dias depois.
Nesse período, mudaram
apenas as ferramentas da mídia. O poderoso rádio e a inexperiente televisão do
fim dos anos 50 e início da década de 60 dão lugar hoje à tevê a cabo e,
principalmente, à internet, a maravilha do fim do século XX e início do XXI. A
rede de computadores se popularizou – e
também se aperfeiçoou – em velocidade geométrica.
As redes
sociais – o Facebook ainda é a principal – competem com a grande mídia e às
vezes a superam na desmistificação de “verdades” impostas pelos grandes
jornais, revistas e emissoras de televisão. O que é mostrado como certo na
grande mídia é desmascarado como errado nas redes sociais. E vice-versa.
Mas o episódio do fuzilamento do traficante
brasileiro mostra, de maneira patética, o lado bom e mau da sociedade. Rachel Scherazade, a musa da nova direita, saiu-se com essa em comentário no SBT: "Aqui se faz, aqui se paga". Milhares
se manifestaram a favor do apelo do governo brasileiro pela vida de
Marco Archer. Apelo, pedido, súplica. Nunca houve intromissão da presidenta
Dilma Roussef nas questões jurídicas indonésias. Em favor da vida. Não da libertação de
Marco Archer. Fez o que qualquer governante comprometido com a causa dos
direitos humanos faria. A Organização das Nações Unidas (ONU) também proferiu, depois de Dilma, veemente
apelo no sentido de que a Indonésia suspenda as execuções (outros traficantes
aguardam o fuzilamento).
A Presidenta
destacou, na nota enviada ao seu colega indonésio, “ter consciência da gravidade dos crimes
cometidos pelos brasileiros”. (há outro condenado brasileiro, o paranaense Rodrigo
Gularte). Declarou “respeitar a
soberania da Indonésia e do seu sistema judiciário, mas “como Chefe de Estado e
como mãe, fazia esse apelo por razões eminentemente humanitárias”. A Presidenta lembrou que “o ordenamento
jurídico brasileiro não comporta a pena de morte e que seu enfático apelo
pessoal expressava o sentimento da sociedade brasileira”.
Mas os “doidinhos do Facebook”, como diz o meu
amigo João Otávio Lobo, não entendem (ou não querem entender) esse apelo em
favor da vida. E não são apenas os desinformados. Um professor de Jornalismo torna
pública essa joia rara de pensamento: “Dilma
quer mudar as leis da Indonésia”!!!!(pontos de exclamação meus). Um scholar com mentalidade de comentarista de programa policial.
Outro se
apresenta como advogado e exibe mais um diamante lapidado: “Vamos respeitar.
mesmo porque a Indonésia é um país lindo, paradisíaco, não tolerando a
marginalidade. Assim observado os trâmites legais, a execução foi justa, embora
achando eu que a pena de morte aplicada em NY. é mais humana ou seja sem
estardalhaços, rápida e indolor. ou seja na base da agulha”. O estilo balofo, a expressão “pena
de morte mais humana”, a falta de vírgulas e o abuso do gerúndio ficam por
conta do jurista.
A novidade
agora, depois do caso Archer, é a apologia da pena de morte e apontar a Indonésia
como modelo a ser seguido pelo Brasil. Que pobreza mental. Há notícias de que
Marco Archer se drogava com metanfetaminas na prisão, adquirida com subornos
de guardas corruptos. A Indonésia é mesmo um país exemplar? Tenho seríssimas
dúvidas.
Lamentável.
A direita brasileira não conhece outra forma de debate político que não seja o
da truculência, da defesa de causas policialescas e bárbaras e o combate a
teses já consagradas internacionalmente: a rejeição da pena de morte é uma delas.
Já entram derrotados nesse embate.
Olavo
de Carvalho, Rodrigo Constantino, Reinaldo Azevedo representam o que há
de pior no Brasil em termos de pensamento obscurantista, medieval, retrógrado.
Entre
os antiesquerdistas da mídia, Luiz Felipe Pondé é o único identificado com a
visão liberal e antiautoritária do mundo.
Os demais
citados por mim, antes de Pondé, estão à direita de Adolf Hitler. O que dizer
dos seus seguidores cearenses? Patéticos, ridículos.
Paulo, muito bem lembrado o caso Chessman pois mesmo eu, que sou "das antigas", não lembrava. E perfeito o título do seu texto sobre o fuzilamento do Marco Archer. A morte não devia vir dessa forma -decretada- para ninguém, nem mesmo para aqueles que concordam com ela, desde que seja na pele de um outro. São esses os que colaboram ativamente com as mil outras formas de morte. Mas nem tudo está perdido amigo! Um habitante de outro planeta -se existir- após tomar conhecimento do seu posicionamento público dirá:"Putz! Na terra ainda existem humanos!"
ResponderExcluirMuito obrigado, Verônica. Pior é quando a gente toma posição contra a pena de morte alguns desinformados - outros mal-intencionados - ficam a pensar que a gente está defendendo o criminoso. Não é isso! Para que castigo pior do que alguém cumprir pena em país estrangeiro, de hábitos e cultura completamente diferentes do que existe no Brasil. É punição exemplar. Por que a morte?
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