Pés de azeitonas pretas em Fortaleza dão sombra e produzem frutas
O cientista (farmacêutico-industral) Edilson Pinheiro Peixoto
declarou, em entrevista ao editor do blog Coluna da Hora, que a azeitona preta
(conhecida também como jamelão ou jambolão) tem tudo para ser o açaí cearense.
“O jambolão (azeitona preta) é mais dietético, podendo ser mais
saudável que o açaí. A Embrapa e Unicamp vêm estudando o jambolão e aos poucos
vai aumentar o interesse comercial”, disse Edilson Pinheiro.
Eis a entrevista:
Paulo Verlaine - A azeitona preta – assim chamada no Ceará – é
fruta muito conhecida de todos. Qual o motivo de não ser valorizada neste
Estado nem em outras regiões do Brasil? Não se vê ninguém a fazer ou a vender
suco de azeitona. Poderia explicar os motivos desse descaso.
Edilson Pinheiro - A
azeitona preta ou roxa, ou diversos outros nomes como se diz no Ceará é
consumida pela população, sim, mas ainda pouco. Em Fortaleza, temos uma única
banca no mercado São Sebastião vendendo a fruta(banca do Sr. Raimundo Moreira, 77 anos, 45 anos de Mercado São Sebastião). É muito pouco. Em frente à agência
dos Correios na Cidade dos Funcionários (bairro de Fortaleza) não sobra uma
fruta nos pés. O guardador de carros tira para quem procura. E assim existem
mil histórias. Tenho conseguido azeitona roxa, ou jambolão, do Trairi, Caucaia
e Cascavel. Existe já polpa disponível na Internet, inclusive a um preço mais
caro que as outras e com boa propaganda das antocianinas. Conversei com o dono
da Frute em Caucaia e ele prometeu lançar a polpa este ano. Falta uma maior compreensão dos benefícios
que ela traz a saúde.
Edilson Pinheiro Peixoto (d.) com único vendedor
de azeitona preta no Mercado São Sebastião,
Sr. Raimundo Moreira.
PV - Sabemos que a azeitona preta não é uma fruta nativa, mas se aclimatou
muito bem em quase todo o Brasil. Na condição de especialista, poderia nos
falar mais acerca desta fruta: as origens, o histórico; como chegou ao Brasil,
em quais regiões brasileiras ela se aclimatou melhor.
EP - Não há históricos muito específicos. A planta veio da Índia, não
na época do chamado descobrimento do Brasil pelos portugueses, e sim posteriormente.
Há relatos de que foram plantadas nas cidades como árvores ornamentais, para
sombreamento, tão queridas no nosso Ceará. Como muitos outros tipos de planta
ela é subexpontânea, ou seja, se aclimatou bem e tem se expandido naturalmente,
acredito que menos no Sul do Brasil. O mais importante é que está aqui e tem
semelhanças, de fruta, com as nossas como açaí e jabuticaba. Na Índia é
conhecida como fruta dos deuses e é consumida em natura e como geleia.
PV - Em termos específicos do Ceará, em quais regiões é mais encontrada a
azeitona preta?
EP - Como já citado, mais comum no litoral, mas no sertão também. É
uma árvore frondosa alcançando altura que chega próximo da manga, devendo ter
forte enraizamento para sua nutrição, portanto podendo sobreviver em áreas mais
secas. É mais comum em baixios, beira de rios ou riachos, ou seja, onde a tem
maior probabilidade de água no subsolo. Jaguaribe, no sertão possui alguns pés.
PV - Poderia discorrer, em termos científicos, mas em linguagem acessível à
maioria dos leitores, claro, sobre a composição da azeitona preta?
EP - A composição completa da azeitona preta (roxa) ou jambolão (sou
favorável a que usemos mais esse nome porque é mais universal) ainda está em
estudo. O destaque é para antocianinas que é um nome que vem de ciano (roxo), a
cor natural das antocianinas aqui, da jabuticaba, do açaí, das uvas, do repolho
roxo, acerola, etc. Alguém já se perguntou como uma fruta aguenta tanto sol nas
plantas e não se degrada. Só os trabalhadores são praticamente obrigados a
aguentar sol trabalhando, se desidratam, queimam a pele, criam vários tipos de
câncer por um processo chamado oxidação que é acelerado pelo sol. Isso pode ser
entendido também como envelhecimento rápido. Quem protege as frutas também são
os antioxidantes próprios que ela produz: vitamina C, clorofila, licopenos e antocianinas
principalmente. O jambolão (azeitona preta) também possui açúcares que são
nutrientes essenciais na nossa alimentação. Gostaria que ao longo do tempo as
palavras antocianinas e licopeno (cor vermelha) fossem incorporadas ao
conhecimento popular como vitamina C ou clorofila.
PV - Fale-nos mais sobre antocianinas e outros componentes. O que isto
significa e quais os benefícios para a saúde humana.
EP - Tenho um pé de acerola em casa e todos os dias tomo uma garrafa
(600ml) de suco e tenho uma pele super saudável para a minha idade (65
anos). Acerola possui bastante vitamina C e um pouco de antocianinas. Pratico
exercícios todos os dias e quando praticamos exercícios nos oxidamos mais (a
chamada respiração celular). O suco restabelece tudo. Diariamente envelhecemos
por oxidação, retardar isso e gerar bem estar é o grande forte dos
antioxidantes e, em absoluto, não precisam ser artificiais. São mais caros
(farmácias) e podem conter composições indesejadas. Os estudos estão avançando
mas esse é o principal e fortíssimo benefício à saúde. Com certeza nos próximos
anos teremos produtos cosméticos, principalmente para a pele e cabelos,
lançados no mercado pois as antocianinas possuem um potencial de antioxidação
20 vezes maior que a Vitamina C que já é muito boa.
PV- Já dissemos que a azeitona preta é encontrada com muita facilidade
no Ceará. Quais seriam então as melhores maneiras de se explorar a fruta sem
impactos ambientais e sem prejuízo para a flora nativa deste Estado?
EP - Não há questões ou problemas ecológicos com o cultivo do jambolão
a não ser nas cidades se não retiradas as frutas em tempo como está acontecendo
em Goiânia, elas caem e tornam o chão liso. Só consumir em tempo e será
corrigido o problema. Ela é uma árvore frondosa que vai contribuir para o
sistema ecológico.
PV - Em termos bem práticos, como a azeitona
preta poderia ser aproveitada pela população cearense. Sucos, sorvetes ou
outras formas de consumo? Poderia chegar ao ponto de ser o “açaí cearense”?
EP - O açaí parece que ganhou
mais popularidade por ser energético. Embora sejam muito semelhantes em fruto e
cor, terão sentidos diferentes, mas semelhantes quanto a antioxidação. O
jambolão (azeitona preta) é mais dietético, podendo ser mais saudável que o
açaí. A Embrapa e Unicamp vêm estudando o Jambolão e aos poucos vai aumentar o
interesse comercial. Podem ser feito sucos, geleias, sorvetes, musses, etc não
terá o inchamento do açaí pela falta de lipídios certamente. Uma forma muito
saudável do jambolão é o desenvolvimento de sua polpa, ainda timidamente
existindo no mercado. Qualquer preparação que não mude a cor roxa das antocianinas
é saudável. As preparações a frio e em pH ligeiramente ácidos são mais
conservadoras das antocianinas. O uso de limão ou ácido cítrico adicionado a
qualquer preparação também vão garantir sua maior estabilidade.
Eu apostaria de primeira mão em
dizer que podemos ter o “açaí dietético ou ligth cearense”.
PV - O grande problema da azeitona preta é a sua alta perecibilidade. Quais
medidas você indicaria para enfrentar essa dificuldade?
EP - Esse realmente é um problema, mas o açaí tem o mesmo problema. Uma
das soluções é a velocidade entre a colheita e consumo ou preparação de polpa,
pois na polpa é estável se esta for mantida em baixa temperatura como
“freezer”. Poderá se aplicar formas de colheita em isopor para abrandar o
efeito perecível do calor. As frutas poderão ser conservadas diretamente em
“freezer” por até dois anos, tempo mais que suficiente entre uma colheita e
outra. O custo sai um pouco mais caro, mas você terá a fruta o ano todo como é
feito na minha casa.
PV - O
que o Governo do Ceará, as universidades, principalmente as públicas, poderiam
fazer para resgatar a azeitona preta e aproveitar as suas potencialidades?
EP - O
governo pode muito: o Ceará possui Universidades capazes de aprofundarem
diversos estudos no assunto no sentido de inserir o jambolão na mesa do
cearense ou brasileiro. A Embrapa pode desenvolver árvores pequenas para serem
plantadas em quintais. O governo precisa antes de tudo ter vontade e divulgar o
assunto com o peso de "marketing" que possui. Acho que os investimentos poderiam ser muito
pouco para estimular a iniciativa privada ou o próprio estado ou prefeituras
(através da merenda escolar, por exemplo) a aderir ao “açaí light cearense” e
em breve futuro estimular o consumo em todo país. As cabeças precisam se abrir
para o assunto senão, logo estaremos recebendo antocianinas da França, em
cosméticos ou outras formas pelo “precinho bom” que eles costumam oferecer.